MPF e DPE querem que Agepen mantenha direito de indígenas usarem sua língua nativa no sistema prisional

Em visitas a penitenciárias femininas do estado, foi constatado que detentas indígenas estavam sendo impedidas de se comunicar na sua língua materna

O Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública do Estado (DPE) de Mato Grosso do Sul enviaram recomendação à Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário (Agepen) para viabilizar a comunicação dos indígenas recolhidos no sistema prisional por meio de suas línguas nativas. Enquanto não forem tomadas as providências necessárias, a Agepen não deve impedir a comunicação entre os indígenas e suas famílias na sua língua materna.

A recomendação, assinada pelo procurador da República Marco Antônio Delfino de Almeida e pela defensora pública Zeliana Luzia Delarissa Sabala, também requer a designação de profissionais devidamente capacitados, quando disponíveis, para atuarem como intérpretes ou facilitadores da comunicação entre os indígenas e os agentes penitenciários. Além disso, foi recomendada a realização de capacitações e sensibilizações direcionadas aos funcionários das penitenciárias, visando à criação de um ambiente pautado no respeito e na valorização da diversidade cultural.

Visitas às penitenciárias – De acordo com o documento conjunto do MPF e DPE, as duas instituições e o Ministério das Mulheres realizaram visitas nas penitenciárias femininas de Ponta Porã e Jateí, no último dia 28 de junho. Nessas visitas, constatou-se que as mulheres indígenas recolhidas no sistema prisional estavam sendo impedidas de se comunicar entre elas e com seus familiares na sua língua materna, por alegado motivo de segurança.

Para os representantes do MPF e DPE, a situação relatada pelas indígenas parece ser uma prática institucionalizada da Agepen, o que os levou à conclusão de que todos os indígenas do sistema prisional de Mato Grosso do Sul têm seu direito humano violado, uma vez que a proibição arbitrária do uso da língua materna constitui ato discriminatório e atentatório contra a dignidade da pessoa humana.

Direitos dos indígenas – A recomendação lembra que a Constituição Federal garante o pleno exercício dos direitos culturais e estabelece como patrimônio cultural brasileiro, objeto de especial proteção, os modos de criar, fazer e viver das comunidades indígenas. Ela também destaca que a Resolução nº 287/2019 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estabelece procedimentos para o tratamento dos indígenas acusados, réus, condenados ou privados de liberdade, determinando que a autoridade judicial busque garantir a presença de intérprete (preferencialmente membro da própria comunidade indígena) em todas as etapas do processo em que o indígena figure como parte.

Além disso, diversas legislações internacionais garantem o direito dos indígenas se comunicarem em sua língua. Dentre elas, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), sobre os Povos Indígenas e Tribais, ratificada pelo Brasil pelo Decreto 5.051/2004, declara que “deverão ser adotadas disposições para se preservar as línguas indígenas dos povos interessados e promover o desenvolvimento e prática das mesmas”.

Para o procurador Marco Antônio e para a defensora Zeliana Luzia, “é necessário ressaltar a inconstitucionalidade e a injustiça de proibir as pessoas indígenas de falarem sua língua nativa, especialmente quando essa prática lhe foi transmitida por seus familiares. É o meio de comunicação utilizado entre elas e suas famílias, que, na maioria das vezes, sequer conhecem outro idioma”. E continuam: “impor restrições à comunicação viola princípios fundamentais de igualdade, liberdade de expressão e respeito à identidade e à autonomia. É imprescindível reconhecer e valorizar a riqueza cultural representada pelos povos indígenas, garantindo um ambiente inclusivo, que permita o pleno exercício desses direitos essenciais.”

Foi fixado o prazo de dez dias para que a Agepen forneça informações acerca do acatamento da recomendação.

Íntegra da recomendação

Da Assessoria do MPF/MS

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